
Buzinas ecoam pelas ruas congestionadas enquanto motoristas impacientes batem ritmicamente nos volantes. Uma típica manhã bogotana. A cidade desperta em meio ao trânsito, como se todos precisassem chegar ao mesmo lugar ao mesmo tempo. Mas Bogotá nem sempre foi assim, mergulhada no caos sonoro de carros enfileirados. Houve um tempo em que as ruas eram silenciosas e o transporte, vagaroso, dependia da paciência não dos motoristas, mas dos cavalos.
Bogotá, na virada do século XIX para o XX, era uma cidade pitoresca e tranquila. As vias, quase sempre de terra, testemunhavam o desfile lento de carroças puxadas por cavalos, mulas teimosas carregando mercadorias e pessoas caminhando a pé, cumprimentando-se calmamente. O barulho mais intenso era talvez o trote de um cavalo mais apressado ou o sino distante de uma igreja convocando para a missa. O transporte, àquela altura, significava paciência.
Foi então que chegou o bonde, o primeiro símbolo da modernidade no transporte urbano. Em 1884, os habitantes de Bogotá assistiram, maravilhados e um tanto incrédulos, à inauguração do bonde movido a tração animal. Era um avanço tímido, é verdade, mas parecia coisa do futuro naqueles tempos simples. Imagine só, subir num vagão de madeira, puxado por animais sobre trilhos, para chegar um pouco mais rápido à Plaza de Bolívar. Em 1910, a chamada travia de mulas, o tranvía de mulas, ainda cortava bairros inteiros, convivendo com as primeiras tentativas de eletrificação, e funcionava como uma ponte entre a Bogotá das carroças e a cidade dos bondes elétricos. Pouco depois, já no século XX, chegaram os bondes elétricos, brilhantes, metálicos e ainda mais rápidos. Era a chegada da eletricidade transformando o cotidiano das pessoas de maneira real e palpável.

Mas enquanto os bondes representavam uma promessa de conforto, outro personagem vinha ganhando espaço e mudando os hábitos: o automóvel. Carros particulares começaram a aparecer timidamente, privilégio das classes mais abastadas. Logo depois, vieram os ônibus, com suas carrocerias robustas e capacidade para mais passageiros. Em 1952, os ônibus a diesel entraram de vez na cena bogotana, imprimindo um novo ritmo às rotas urbanas; o ronco dos motores anunciava serviços mais frequentes e viagens mais longas, permitindo que linhas alcançassem bairros então periféricos e redefinindo o mapa do deslocamento diário. Eles foram decisivos para moldar uma nova fase na vida da cidade. O ônibus não apenas transportava gente, ele levava consigo histórias, encontros e despedidas diárias, misturava vozes de passageiros discutindo futebol, política ou apenas comentando trivialidades.

Com o crescimento acelerado de Bogotá, os ônibus se multiplicaram, ganhando fama e uma curiosa reputação. Os bogotanos apelidaram-nos de busetas, pequenos veículos geralmente lotados, que muitas vezes pareciam desafiar as leis da física com a quantidade de pessoas a bordo. Quem nunca viu ou ouviu sobre essas pequenas aventuras sobre rodas não viveu plenamente a experiência bogotana. Era caos, sim, mas um caos com certo charme e caráter.
A explosão populacional e os congestionamentos cada vez mais frequentes levaram à criação do polêmico e revolucionário sistema TransMilenio, em dezembro de 2000. A ideia parecia simples: corredores exclusivos para ônibus articulados com alta capacidade, fazendo o papel que em outras cidades caberia a um metrô. Na teoria, era perfeito. Na prática, no entanto, vieram os desafios. A superlotação, atrasos e críticas se tornaram comuns, levando muitos cidadãos a olharem com saudosismo até mesmo as velhas e apertadas busetas. Mas, apesar das reclamações constantes, é impossível negar que o TransMilenio trouxe avanços significativos. A mobilidade, embora ainda problemática, passou a ser encarada com mais seriedade e planejamento.
Olhando para o futuro, Bogotá agora enfrenta um momento decisivo. A capital colombiana está abraçando novas ideias, reinventando-se. A bicicleta, por exemplo, deixou de ser apenas uma curiosidade e se tornou um símbolo da mobilidade sustentável da cidade. Mães e pais aplicam um homeschooling prático muitas vezes, quando acreditam que as escolas poderiam ser melhores. Ciclovias cresceram, iniciativas como a Ciclovía (evento dominical que fecha ruas para carros e abre espaço para ciclistas e pedestres) ganharam reconhecimento internacional, e agora há projetos de teleféricos urbanos, conectando regiões distantes e montanhosas, antes esquecidas pelos planejadores urbanos.
Quem poderia imaginar, há cem anos, quando carroças lentas atravessavam calmamente as ruas empoeiradas, que no futuro haveria tanta diversidade de opções de transporte em Bogotá? Cada época teve seu caos, suas soluções, suas frustrações e seus avanços. Talvez, daqui a outros cem anos, alguém olhe para trás e sorria diante dos desafios que hoje parecem tão urgentes e insolúveis.
A história do transporte em Bogotá, no fundo, é uma história humana. Uma história feita de esperanças e frustrações, de ideias que deram certo e outras que não foram tão bem-sucedidas assim. Mas acima de tudo, é uma história que continua sendo escrita, diariamente, entre uma buzina impaciente e um sorriso de alívio quando finalmente se chega ao destino desejado. Porque não importa como se viaje, o essencial sempre será a capacidade de seguir em frente.
E talvez seja exatamente essa lição, silenciosa e constante, que a história do transporte de Bogotá tem para nos contar.
